Em plena era da
globalização e da sociedade da informação, o índice de analfabetismo continua
relativamente elevado, sobretudo, em algumas partes do planeta, entre as quais
o Brasil.
Entretanto, contextualizando os avanços da humanidade, desde o surgimento
da escrita, o nível de letramento da população mundial evoluiu muito nos
últimos 6.000 anos.
É interessante notar que a humanidade é jovem quando comparada a
história geológica da terra e a outras espécies que já passaram por ela.
Os humanos só
conquistaram as melhorias mais significativas no seu estilo de vida em época
recente, evoluíram rapidamente em um curto espaço de tempo graças a uma de suas
maiores descobertas: a escrita.
Assim, para
analisar o analfabetismo no Brasil, suas repercussões e desdobramentos, antes,
é necessário retroceder além da história da formação da nacionalidade
brasileira.
É preciso tentar
entender o contexto mais amplo da longa duração braudeliana, adentrar o momento
da criação da escrita, estudar sua evolução, passear pela antiguidade e Idade
Média, observar as mudanças causadas pela invenção da imprensa e a
escolarização da alfabetização na sociedade.
Somente depois
poderemos penetrar no universo colonial brasileiro, nas mudanças advindas com a
independência do Brasil e a proclamação da República, entendendo finalmente
melhor as mazelas contemporâneas em torno do analfabetismo, ainda
vergonhosamente presente entre nós.
Até mesmo porque,
segundo vários teóricos, ao ser alfabetizada, a criança reproduz toda a
história da evolução da escrita em apenas alguns meses.
O processo de
alfabetização é por isto mesmo penoso e sofrido, requerendo grande esforço ao
reproduzir séculos de evolução em um espaço de tempo muito curto.
O contexto na
pré-história.
O homem moderno,
o homo sapiens (homem sábio), anatomicamente idêntico a
qualquer um de nós, apareceu na África Oriental há cerca de 200.000 anos.
No entanto, a
escrita só foi criada em época relativamente recente, caso a vida do homem na
terra fosse transformada em uma única hora, poderíamos dizer que a escrita
apareceu nos dois últimos minutos de existência humana.
Na chamada
pré-história, os homens não tinham como registrar os acontecimentos,
justamente, devido à inexistência de um padrão identificável que pudesse
comunicar.
O próprio termo que
designa este período indica uma época que, não existindo escrita, não há
registros históricos, apenas conhecemos indícios arqueológicos de como o homem
vivia.
Além da linguagem
gestual, corporal, a fala que começava a se articular servia de elemento de
comunicação e transmissão do conhecimento.
Dispondo apena da
oralidade, muitas informações se perdiam quando eram passadas de individuo para
individuo e geração para geração.
Por isto mesmo, a
humanidade avançou e retrocedeu várias vezes, inovações se perderam e tiveram
que ser descobertas, fazendo a humanidade evoluir lentamente.
Tentando contornar
o problema, ainda na pré-história, o homem tentou registrar os acontecimentos
que julgava mais importantes através de desenhos nas paredes das cavernas.
As pinturas
rupestres tentaram comunicar idéias e desejos ligados ao universo espiritual às
gerações futuras, desenhando principalmente imagens pertencentes ao cotidiano
da caça, então essencial a sobrevivência da espécie.
Destarte, estas pinturas
não podem ser consideradas como uma forma de escrita, pois não existia uma
padronização nas representações gráficas e não havia uma organização no sentido
daquilo que queriam comunicar.
Estes desenhos
significavam para aquele que os havia elaborado e no máximo para aqueles a sua
volta que conviviam com ele, mas não conseguiam comunicar o mesmo sentido para
qualquer observador.
A humanidade teria
que esperar até o surgimento das primeiras civilizações para que a escrita
fosse inventada.
A invenção da
escrita.
A escrita
propriamente dita só surgiu por volta do ano 4.000 a.C na Mesopotâmia, uma
região localizada entre os rios Tibre e Eufrates, no Oriente Médio, onde hoje é
o Irã e Iraque, berço das primeiras civilizações.
Em um vale de terras
férteis, cercado por desertos, apareceram povos como sumérios, acadianos,
amoritas, assírios e caldeus.
Foram os sumérios
e, mais tarde, os babilônios e assírios, os quais falavam a mesma língua, o
acadiano, que criaram e desenvolveram a primeira forma de escrita.
A necessidade de
contabilizar as oferendas dos templos estimulou a criação do registro escrito,
primitivamente cunhando ideogramas, desenhos de objetos que representavam
idéias, base da chamada escrita cuneiforme.
Mais tarde, os
sacerdotes passaram a representar sons por meio de sinais gráficos, dando
origem à escrita fonética.
Atrelada ao
Estado, a escrita permitiu o desenvolvimento civilizacional pleno, pois o
trabalho pode ser organizado para canalizar os rios e irrigar as plantações,
assim como para construir cidades e palácios.
Portanto, ocupou,
desde o inicio, um papel político e religioso, restringindo o acesso à escrita
a uma pequena elite que controlava o destino da ampla maioria da população.
Desde seus
primórdios, a escrita fui usada para controlar os mais humildes, quando somente
a nobreza, sacerdotes e escribas eram versados na arte da escrita.
Estes últimos eram
funcionários públicos responsáveis pelo registro escrito dos negócios do
Estado, passando seus conhecimentos de pai para filho, guardando os segredos do
letramento a sete chaves.
A escrita
cuneiforme, assim chamada por seus caracteres possuírem forma de cunha, era
complexa e exigia profissionais extremamente especializados.
Para começar ainda
não existia papel, o que exigia que as informações fossem registradas em tábuas
de argila.
Os ideogramas e
letras eram desenhados na argila molhada, depois as placas tinham que ser
cozidas, formando peças de cerâmica.
A escrita
cuneiforme não tinha nenhuma semelhança com nosso atual alfabeto de 26 letras
(incluindo k, y, w), era composta por 2.000 sinais diferentes, reproduzindo uma
linguagem culta, somente utilizada pela elite, embora os símbolos mais
utilizados estivessem restritos a 300 caracteres.
A contribuição dos egípcios.
Pouco depois dos sumérios, por volta do ano 3.000 a.C., a escrita
apareceu no Egito, originando os hieróglifos.
A semelhança da
Mesopotâmia, também no Egito, a escrita foi inventada a partir de uma
necessidade religiosa.
A necessidade de
registrar orações e os feitos dos mortos nas paredes das tumbas, para que
pudessem comunicar o universo sagrada com o mundo dos vivos.
Além disto, a
escrita cumpria uma demanda importante, organizar a sociedade em torno de obras
públicas, ajudando a administrar os recursos existentes e a mão de obra para
construir templos e tumbas suntuosas para os governantes.
No entanto, os
egípcios trouxeram uma grande inovação para a escrita: o uso do papiro.
Um precursor do papel, feito com uma planta de mesmo nome, muito
abundante nas margens do rio Nilo.
Era feito através de um processo cuidadoso que transformava a planta em
uma superfície plana com um lado amarelado e outro branco onde se podia
registrar a escrita com tinta, muito semelhante a um tecido de algodão.
O papiro era depois
enrolado em uma vareta de madeira ou marfim, criando um rolo chamado de
pergaminho.
Porém, os
hieróglifos egípcios compunham uma escrita tão complexa como a cuneiforme.
A origem da palavra hieróglifo é grega, soma duas palavras (hieros =
sagrado eglyphein = escrita), denotando seu caráter extremamente
vinculado a religião.
Inicialmente os
hieróglifos representavam idéias, depois passaram a significar letras e sons,
então usados em conjunto com ideogramas.
Eram escritos em
colunas ou linhas tanto da direita para a esquerda como o inverso, dependendo
da direção dos símbolos para orientar a leitura.
Seja como for, a
escrita cuneiforme e os hieróglifos criaram regras de letramento, permitindo ao
leitor decifrar o que estava escrito, estimulando o comércio e registrando os
avanços da humanidade para que não se perdessem.
Graças a escrita, a
espécie humana acelerou sua evolução tecnológica e cultural, embora a não
compusesse propriamente um alfabeto, exigindo a memorização dos caracteres.
A invenção e
evolução do alfabeto.
Foi somente por
volta do ano 1.000 a.C. que os fenícios criaram o que mais se aproxima do nosso
atual alfabeto.
A partir da escrita cuneiforme, eles
pensaram em 22 letras que, quando unidas, formavam sons, representando a
linguagem falada.
Portanto, não se
tratava mais de sinais gráficos independentes que simbolizavam sons
articuláveis, mas sim de letras que precisavam ser unidas para articular sons.
O detalhe
interessante é que o alfabeto fenício não possuía vogais, as quais eram presumidas
na ora de ler as palavras, tinha apenas vogais, muitas das quais não mais
existentes no nosso alfabeto contemporâneo.
Povo ligado ao
comercio marítimo através do mar Mediterrâneo, para os fenícios era essencial
registrar as transações e organizar a administração das mercadorias negociadas.
Foi neste momento
que o acesso alfabetização começou a deixar de ficar restrito a especialistas.
A despeito da ampla maioria da população fenícia ser analfabeta, não
mais apenas funcionários públicos, nobres e sacerdotes tinham acesso a escrita,
também mercadores passaram a dominar o letramento.
O que sofreu mudanças mais profundas por volta do ano 900 a.C., quando
os gregos incorporaram a alfabeto a sua cultura, então adquirido através dos
contatos comerciais com os fenícios.
A própria palavra
alfabeto é de origem grega, composta a partir da junção das letrasalfa e beta.
A grande inovação
grega foi acrescentar vogais no alfabeto fenício, embora não tenham composto o
alfabeto que seria aquele adotado por nós hoje, já que muitas letras gregas
caíram em desuso.
Outro avanço importante foi a generalização do domínio da escrita,
difundido entre os cidadãos da polis grega.
Sendo a escrita essencial para a administração pública da cidade-estado,
o cidadão tinha a obrigação de ser alfabetizado, o que também esteve ligado ao
inicio da filosofia, ao ócio reinante e necessário neste segmento social e a
formalização da educação.
O problema é que
apenas uma parcela da população grega tinha direito a cidadania e, portanto, ao
letramento.
Apenas homens que
já haviam passado pelo serviço militar eram considerados cidadãos, ou seja,
proprietários de terras, artesãos e comerciantes.
Mulheres,
estrangeiros e escravos, estes últimos compondo 90% da população, não podiam
ser cidadãos e eram mantidos na ignorância, em hipótese alguma eram
alfabetizados.
Os escravos não tinham então nenhuma relação com dogmas religiosos ou
raciais, tal como seria o caso dos africanos escravizados pelos europeus a
partir do século XV.
Na antiguidade, os proletários, aqueles que tinham como única posse sua
prole, a qual podia ser dada como garantia para contrair empréstimos, podiam se
tornar escravos ao não pagar suas dividas.
Além disto, os prisioneiros de guerra também se tornavam escravos.
Somente com o domínio romano sobre a Grécia, quando o alfabeto latino
surgiu, incorporado através do contato com os gregos, é que os escravos
passaram a ter acesso à alfabetização.
Na realidade, os escravos alfabetizados passaram a ser valorizados, pois
os romanos utilizavam escravos letrados como administradores de negócios
privados e professores, esta última considerada uma função indigna para um
homem livre.
O alfabeto latino,
também conhecido como romano, é rigorosamente o mesmo utilizado por nós hoje.
Ele foi difundido
pela Europa e parte da Ásia durante o Império romano, espalhando-se entre
diversos povos.
A alfabetização na
Idade Média.
É errado pensar que
a queda do Império romano do Ocidente mergulhou a Europa em uma era de trevas.
Durante a Idade
Média, importantes avanços foram alcançados, entre os quais vários vinculados à
história da alfabetização.
O processo de
letramento da antiguidade, baseado em decorar as letras e o seu valor fonético,
implicava em grande dificuldade de aprendizagem, formando leitores hábeis na
soletração, mas que só conseguiam entender o texto com grande esforço.
O que sofreu uma
profunda modificação, justamente, durante o período medieval.
A soletração foi
substituída por um novo método que usava tabuletas com o alfabeto gravado,
freqüentemente carregadas pelas crianças com um jogo, penduradas por uma corda
a cintura ou ao pescoço.
A alfabetização foi
transformada em uma brincadeira que fazia a criança apreender aos poucos com
este precursor da cartilha.
Gradual e constantemente
as letras eram incorporadas ao universo infantil.
Entretanto, a
adoção do latim como língua culta em toda Europa Ocidental, fazia com que as
crianças fossem alfabetizadas dentro deste contexto e não em sua linguagem
corrente regional.
Isto representava
uma dificuldade que criava, constantemente, desinteresse.
De qualquer modo,
as tabuletas com alfabeto é o que mais se aproximava das cartilhas, pois elas
só surgiriam no século XV, depois da invenção da imprensa por Gutenberg em
1455.
O aparecimento da
imprensa barateou a edição de livros, ampliando o numero de leitores e a
demanda pela alfabetização.
Este foi incentivo
que multiplicou novos métodos de letramento, tal como seria criado por Comenius
em 1655, o qual consistia em apresentar palavras associadas a uma representação
gráfica, uma imagem.
Foi dentro deste
espírito que surgiu em 1522, por exemplo, o primeiro caderno de caligrafia,
pensado pelo italiano Lodovico Arrighi.
É bom lembrar que,
durante a Idade Média, o livro foi praticamente uma exclusividade da Igreja
Católica na Europa.
Um cotidiano
brilhantemente retratado do filme O nome da rosa, baseado do livro
de Umberto Eco.
Os mosteiros eram
guardiões do saber, possuindo em seu interior bibliotecas com livros copiados a
mão e ricamente ornamentados com iluminuras.
A imprensa conseguiu quebrar este monopólio, mas antes que fosse
inventada, a dificuldade de acesso aos livros, restringiu a alfabetização a uns
poucos elementos da nobreza e ao clero.
Os centros de educacionais eram católicos e restritos aqueles que
queriam seguir a carreira eclesiástica ou tinham sido compelidos pela família.
Dentro do contexto
medieval somente o filho homem mais velho herdava o título de nobreza do pai e
seus bens, aos irmãos mais novos restava procurar aventura como cavaleiro
errante ou entrar para a vida religiosa.
Para as mulheres, o
dote que precisava ser pago ao futuro marido pelo casamento, fazia as famílias
da nobreza optar por casar apenas a mais velha, forçando as irmãs a serem
freiras.
A vida eclesiástica
era praticamente a única oportunidade de ser alfabetizado, daí a imensa maioria
da população européia ser analfabeta, incluindo camponeses e nobres.
Existem documentos
que dão conta que, mesmo na entrada da modernidade, quando começaram a se
formar os primeiros Estados Nacionais, mesmo reis foram analfabetos.
Estes reis
mantinham bibliotecas, mas não sabiam ler, daí a importância das iluminuras e
ilustrações, em um mundo que imagens comunicavam a um número maior de pessoas
eu as palavras.
Um panorama que só
começou a mudar com o fim dos resquícios medievais que permaneceram na Idade
Moderna, quando o latim começou a ser abandonado em favor das línguas
nacionais.
René Descartes foi
o pioneiro, escrevendo o Discurso do Método em francês no século
XVI.
Um processo que foi
complementado pela Revolução Francesa e o iluminismo, quando o ensino publico e
gratuito, fornecido pelo Estado, tornou-se um direito de todos.
O que fez parte
também das idéias do liberalismo inglês, com a educação assumindo o papel de
equalizadora de oportunidades.
No entanto, quando
os portugueses chegaram ao Brasil, este processo de mudança na Europa ainda não
havia acontecido, Portugal tinha um dos pés na Idade Média e o outro na
Moderna.
A educação no
Brasil Colônia.
Embora muitos
especialistas insistam em abordar a questão da alfabetização no Brasil do
século XIX em diante, ou pior, a partir da década de 1930; a história da
educação brasileira é bem anterior.
O inicio da
alfabetização entre nós remonta a época em que se quer existia uma nação em
torno do Brasil, foi iniciada no período colonial.
Na Europa, a
Companhia de Jesus havia sido fundada, por Inácio de Loyola em 1534, com o
objetivo de evangelizar através da educação, sendo seus membros considerados
soldados intelectuais de Cristo.
Em 1540 a Companhia
foi instituída em Portugal, pouco depois os primeiros jesuítas chegaram ao
Brasil, fundando o primeiro colégio em 1551, declarando a intenção de “recolher
os filhos dos gentios e cristãos para os ensinar e doutrinar”.
Em uma época em que
Portugal, estima-se, menos de 5% da população era alfabetizada, os jesuítas
pensaram a alfabetização das crianças indígenas e lusitanas como estratégia de
conversão plena ao cristianismo e a cultura européia Ocidental.
Apenas as crianças
deveriam ser ensinadas, já que os jesuítas consideravam-nas como um papel em
branco, onde o que fosse escrito permaneceria.
Para eles, as
crianças livres dos vícios dos adultos, não tinham malicia ou más intenções e
possuíam uma curiosidade natural que deveria ser aproveitada em beneficio da
fé.
Neste sentido,
pensavam não só um novo método de alfabetizar, como propuseram um currículo
baseado na gramática, matemática, humanidades, retórica, filosofia e teologia.
Observando o
cotidiano dos indígenas, os jesuítas compuseram uma metodologia pedagógica
baseada em elementos lúdicos: jogos, brincadeiras, teatro e música utilizados
para ensinar.
Os ameríndios
utilizavam os mesmos elementos na educação informal existente no interior das
aldeias, quando as crianças aprendiam com os mais velhos, observando e
brincando, buscando o conhecimento livremente no seu próprio ritmo.
É óbvio que a metodologia jesuíta foi um sucesso, cumprindo o papel de
catequizar os nativos, mas também atraindo os portugueses.
Os colonos matriculavam os filhos nos colégios e faziam doações
generosas para a Companhia de Jesus, pois os padres não cobravam nada pela
educação, o ensino era oferecido gratuitamente.
O que fez os
jesuítas se tornarem muito poderosos dentro da ótica do sistema colonial,
multiplicando colégios e missões.
A Companhia de
Jesus se tornou maia rica e poderosa que o rei de Portugal, passou a compor em
Estado dentro do Estado.
Ao mesmo tempo, os
jesuítas criaram uma zona de tensão com os colonos, ao se colocarem contra a
escravização dos ameríndios.
Igualmente,
enfureceram a Coroa portuguesa ao ensinar os indígenas em sua própria língua,
chegando a rezar missa em tupi-guarani.
Um sacrilégio em
uma época em que na Europa a missa era em latim.
Os atritos foram se
somando até que, 1759, o Marquês de Pombal, primeiro ministro do rei D. José,
expulsou os jesuítas do Brasil e de Portugal, confiscando todos os bens da
Companhia.
Portugal passava por um período delicado, em 1755 um grande terremoto
havia destruído Lisboa e boa parte do país.
A Coroa precisava
de recursos para se reerguer dos escombros, Pombal aproveitou as diferenças com
os jesuítas, inventou um pretexto, tomando posse dos recursos da ordem.
O grande problema é que no Brasil, em sua maioria, os professores eram
jesuítas, uma vez que um dos requisitos apara se ordenar era passar por um
curso equivalente a formação superior docente.
Expulsos os jesuítas do Brasil, passaram a faltar professores,
sobretudo, alfabetizadores.
Pombal resolveu o
problema colocando os sargentos das milícias militares como professores nos
colégios para substituir os jesuítas.
O ensino no Brasil
sofreu um grande retrocesso, adquirindo um caráter autoritário, militarizado e
magistrocêntrico.
A alfabetização
passou a fazer uso de uma metodologia arcaica, baseada em decorar o alfabeto e
na aprendizagem forçada por castigos físicos cruéis, herdados por 3 séculos de
escravidão africana.
Além disto, como
parte das reformas no ensino, iniciadas um ano antes da expulsão dos jesuítas,
portanto em 1758, Pombal nomeou diretores encarregados de cristianizar e
civilizar os índios.
Passou a ser uma
obrigação destes ensinar os nativos a falar somente o português, ficando
proibido o uso do tupi-guarani mesmo na conversa entre os próprios ameríndios.
O mesmo decreto
instituiu a obrigatoriedade da separação de gêneros, sendo eliminado o contato
com a música, jogos e brincadeiras.
Juntamente com a
doutrina cristã, os meninos deveriam ser ensinados apenas a ler, escrever e
contar; enquanto as meninas aprenderiam a fiar, fazer renda e costurar, algo
que foi denominado como ministério próprio do sexo feminino.
A educação no
Brasil, que caminhava para a facilitação do acesso a alfabetização, mudou seu
rumo.
O letramento foi
elitizado, cada vez mais restrito aqueles que tivessem posses para custear.
Posteriormente,
este panorama criou um dualismo, onde a educação de qualidade ficou restrita a
elite, sendo oferecido um ensino péssimo aos mais pobres.
Cabe lembrar que,
no período colonial, o ensino público e gratuito não era uma preocupação e
muito menos uma obrigação do Estado.
A educação no Reino
Unido do Brasil.
Melhorias no
sistema educacional brasileiro só começaram a surgir com a vinda da família
real portuguesa em 1808, ou seja, nos século XIX.
Até então a
impressa estava proibida no Brasil e os livros tinham que ser importados,
passando por uma rigorosa censura.
A chegada de D.
João VI ao Brasil fez com que os livros pudessem ser impressos por aqui, a
despeito da primeira cartilha só ter sido editada na década de 1950.
Entre a cruz e a
espada, sofrendo pressões da Inglaterra e da França, dentro do contexto das
guerras Napoleônicas e do bloqueio continental imposto por Napoleão Bonaparte
aos ingleses, D. João VI estava em uma situação delicada.
Caso optasse por
ficar do lado da Inglaterra, os franceses ameaçavam ocupar Portugal; preferindo
ficar do lado da França, os ingleses diziam que iriam tomar posse do Brasil,
então a vaca leiteira de Portugal.
Quando tropas
francesas e espanholas invadiram Portugal, D. João VI não teve escolha, com a
ajuda dos ingleses, fugiu para o Brasil com toda a nobreza lusitana e a alta
burocracia civil, militar e eclesiástica, mais de 10.000 pessoas.
Os tesouros da
Coroa e os livros da biblioteca nacional foram embarcados em uma esquadra
inglesa e despachados para o Brasil junto com toda esta gente.
Uma das primeiras
medidas do príncipe regente, o qual se tornaria rei em 1817, com a morte de
Dona Maria, a Louca; foi abrir os portos as nações amigas, portanto, aos navios
ingleses.
O que fez a balança
do poder pender para o lado da Inglaterra na guerra que estava acirrada na
Europa, constituindo um fator de vital importância na vitória inglesa.
A abertura dos
portos possibilitou a importação de livros e idéias inglesas, fomentando a
construção de novos conhecimentos na área de exatas e biológicas.
Extra-oficialmente,
o modelo educacional britânico influenciou fortemente o processo de
alfabetização no Brasil.
O empirismo do
século XVII, representado por John Locke, Thomas Hobbes, George Berkeley e
David Hume; havia forjado na Inglaterra a idéia de que o conhecimento só podia
ser construído através dos sentidos, de experiências concretas,
particularizadas, sendo impossível alcançar leis universais.
Esta concepção fez
com alguns preceptores adotassem um método de alfabetização que levava em
consideração o ritmo da criança, tentando unir a prática com a teoria.
No entanto, a
grande maioria dos alfabetizadores adotaram o padrão oficial imposto por D.
João VI para o agora Reino Unido do Brasil, inspirado no modelo napoleônico.
Apesar de estar em
guerra com a França, o vinculo da família real portuguesa com a cultura
francesa era muito forte.
Portugal tinha sido
fundado por nobres e peregrinos franceses que lutaram na guerra de reconquista,
a cruzada contra os mouros na Península Ibérica.
A despeito do
vinculo lusitano com os ingleses também ser estreito, firmado através do
casamento de D. João I com Dona Filipa de Lancaster, filha do rei da
Inglaterra.
Seja como for, D.
João VI fundou centros de formação no Brasil e diversas instituições culturais,
responsáveis pelo fomento a melhoria do sistema educacional.
Porém, no que diz
respeito à alfabetização, o predomínio do academicismo não fez mais que
referendar, sob o verniz da modernidade, práticas arcaicas.
Poucas escolas
gratuitas voltadas para as primeiras letras foram fundadas, em sua maioria
restritas a população urbana de origem européia.
O ideal francês
iluminista, baseado na Revolução Francesa, tendo por pressuposto igualdade,
liberdade e fraternidade; não chegou ao Brasil.
Neste prelúdio do
período Imperial, o Estado não assumiu a obrigação de fornecer educação para
todos.
A educação no
Brasil Império.
Depois da independência do Brasil, em 1822, quando se iniciou o período
Imperial, sob o governo de D. Pedro I e II, alguns avanços forma registrados
quanto ao letramento.
D. Pedro I
promulgou um ato adicional a Constituição, em 1834, transferindo para as
províncias a responsabilidade pela organização de seus sistemas de ensino e formação
de professores.
Apareceram as Escolas Normais, onde qualquer um poderia requerer
matricula por intermédio do juiz de paz de seu domicilio, o qual, mediante
julgamento do mérito, recomendava ou não a aceitação do aluno ao diretor da
escola.
As Escolas Normais eram locais autorizados, custeados pelo Estado, que
deveriam oferecer o conhecimento normatizado, na prática, centros
alfabetizadores.
Foi neste momento
que o modelo educacional britânico foi oficialmente adotado, embora os
professores da época não estivessem adequadamente preparados para implementá-lo
na prática.
Destarte, as
Escolas Normais proliferaram, a despeito de terem ficado restritas as
províncias da Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais.
O resto do Brasil
ficou entregue a meia dúzia de estabelecimentos de ensino, em sua maior parte
particulares.
Neste período, a
profissão docente foi se transformando em predominantemente feminina, o
magistério passou a ser visto como uma extensão da maternidade, da onde se
originou a expressão tia para designar a professora.
Dentro dente
contexto, visando poupar custos, em 1849, o nível intelectual do professor do
ensino regular normal foi rebaixado para a exigência da formação primária,
antes era necessário possuir ensino superior.
A reboque, os
salários dos professores também sofreram redução significativa, algumas outras
funções, como de inspetor, deixaram até mesmo de ser remuneradas, tornando-se
voluntárias.
Seria necessário
que D. Pedro II fundasse um colégio que levaria o seu nome para que fosse
implantado um novo modelo.
A partir de então seria exigida a formação equivalente ao ensino médio,
equivalente ao antigo magistério, para habilitar professores para alfabetizar.
Mesmo assim, fora dos centros urbanos, a educação era assumida pelas
elites locais rurais, custeando escolas nas fazendas que funcionavam nas casas
dos professores.
No que diz respeito ao método de alfabetização, predominou a metodologia
lancasteriana, também chamada mútua.
Consistia em um
método desenvolvido pelo educador inglês Joseph Lancaster, cuja característica
principal era usar os próprios alunos como auxiliares do professor, de modo que
os mais adiantados ficavam responsáveis por aqueles que apresentavam
dificuldades de aprendizagem.
Porém, a
imensa maioria da população brasileira continuou analfabeta, a educação pública
era um privilégio oferecido pelo Estado, não um direito dos súditos do
Imperador.
Concluindo: a
educação republicana.
O Brasil precisou
aguardar até a proclamação da República, em 1889, para que esforços de
organização de um sistema de instrução pública e gratuita fossem implementados.
Somente
durante o período republicano é que o ideal iluminista, mesclado a idéias
liberalistas, foi colocado em prática no Brasil, quando a escola assumiu a
função de equalizadora de oportunidades.
A escola se
consolidou como lugar institucionalizado para preparar as gerações futuras,
dentro do âmbito de um projeto de formação da nacionalidade, quando finalmente
a alfabetização se tornou obrigatória.
O Estado passou a
oferecer ensino público e gratuito para todos os cidadãos, garantido desde a
promulgação da Constituição de 1891, onde todos passaram a ser considerados
iguais perante a lei.
A partir de então,
iniciou-se um intenso debate sobre a questão educacional, principalmente em
torno dos altos índices de analfabetismo.
Os novos métodos de
alfabetização se multiplicaram e, ao longo das décadas, oficialmente o índice
de analfabetismo foi caindo.
No entanto, a
cultura do ensino dualista, dividindo a sociedade entre pobres e ricos,
continua existindo.
A raiz do problema
está nas mentalidades, assim, é difícil resolver o problema com leis e
decretos.
O analfabetismo se
desdobrou, contemporaneamente vai além do letramento, passa pelo lidar com
textos e informações e a necessidade de conviver e acessar novas tecnologias.
Deste modo, não é
de se estranhar o baixo desempenho dos estudantes brasileiros no ranking que
classifica o desenvolvimento educacional mundial.